Responsável por detectar operações financeiras suspeitas, o Coaf
(Conselho de Controle de Atividades Financeiras), órgão do Ministério da
Fazenda, concluiu no último dia 23 de outubro um documento explosivo.
Chama-se ‘Relatório de Inteligência Financeira 18.340.’ Tem 32 páginas.
O
conteúdo foi exposto pelo repórter Thiago Bronzatto em notícia
veiculada na mais recente edição de Época. O relatório do
Coaf revela transações com indícios de irregularidades de pessoas e
empresas que se encontram sob investigação nas operações policiais que
eletrificam a República: Lava Jato, Zelotes e Acrônimo. Entre elas Lula e
três ex-ministros petistas: Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil),
Fernando Pimentel (Desenvolvimento) e Erenice Guerra (Casa Civil).
Juntas essas pessoas e suas logomarcas registraram movimentação de
notáveis R$ 297,7 milhões. Lula, Palocci, Pimentel
e Erenice integram uma lista de 103 pessoas e 188 empresas varejadas
pelo Coaf. Juntas, movimentaram quase meio bilhão de reais em operações
que, por atípicas, foram informadas pelo Coaf ao Ministério Público
Federal, à Polícia Federal e à Receita Federal. Enviou-se uma cópia do
levantamento também para a CPI do BNDES.
As informações
colecionadas pelo Coaf foram repassadas pelos bancos e corretoras. Essas
instituições são obrigadas a informar ao órgão da Fazenda sobre
transações que, por fugirem dos padrões, podem ocultar crimes como
pagamento de propinas e lavagem de dinheiro. Em relação a
Lula, o Coaf farejou uma movimentação de R$ 52,3 milhões nos últimos
quatro anos. A empresa de palestras do ex-presidente petista recebeu R$
27 milhões e transferiu R$ 25,3 milhões. Para o Coaf, trata-se de
“movimentação de recursos incompatível com o patrimônio, a atividade
econômica ou ocupação profissional e a capacidade financeira do
cliente.” Procurada, a assessoria de Lula preferiu não se manifestar
objetivamente sobre o relatório.
No seu item de número 8,
o documento do Coaf anotou que “Luiz Inácio Lula da Silva foi objeto de
três comunicações de operações suspeitas efetuadas por empresas
atuantes no mercado segurador”. Essas comunicações ocorreram porque Lula
adquiriu planos de previdência privada ou título de capitalização com
valores superiores a R$ 1 milhão.
Em transação efetivada no dia
29 de maio de 2014, Lula pagou R$ 1,2 milhão à Brasilprev Seguros e
Previdência S.A.. Em 6 de junho de 2014, a empresa que leva as iniciais
de Lula em sua logomarca —LILS Palestras, Eventos e Publicações Ltda.—
contratou por R$ 5 milhões um plano de previdência na BB Corretora de
Seguros e Administradora de Bens S.A.. No mesmo dia 6 de junho de 2014,
repassaram-se mais R$ 5 milhões à Brasilprev.
Sobre Antonio
Palocci, ex-ministro da Fazenda de Lula e ex-chefe da Casa Civil de
Dilma Rousseff, o relatório do Coaf menciona a movimentação nas contas
da empresa dele, a consultoria Projeto. Coisa de R$ 216 milhões entre
entradas e saídas, desde junho de 2011.
Eis o que anotou o Coaf
sobre Palocci: “Contas que não demonstram ser resultado de atividade ou
negócios normais, visto que utilizadas para recebimento ou pagamento de
quantias significativas sem indicação clara de finalidade ou relação com
o titular da conta ou seu negócio.”
A certa altura, o Coaf
resume os informes que recebeu da rede bancária: “A empresa Projeto,
Consultoria Empresarial e Financeira Ltda, com sede fiscal na cidade de
São Paulo, composta societariamente por Antonio Palocci Filho (98%),
André da Silva Palocci (1%) e James Adrian Ortega (1%), foi objeto de
comunicações de operações financeiras […] com valor associado de R$
216.245.708,00, reportados no período de 2008 a 2015, dos quais R$
185.234.908,00 foram registrados em suas contas correntes e o restante
em contas de terceiros…”
Numa das transações, a empresa de
Palocci recebeu R$ 5.396.375 da montadora de automóveis Caoa,
investigada sob a suspeita de ter comprado uma medida provisória. O
advogado de Palocci, José Roberto Batochio, declarou que “não há relação
alguma entre o serviço prestado pela Projeto para a Caoa e a aprovação
de medidas provisórias.”
Quanto ao ex-ministro Fernando
Pimentel, hoje governador de Minas Gerais, a movimentação financeira
registrada no relatório do Coaf atingiu o montante de R$ 3,1 milhões. O
órgão recebeu três informes do sistema bancário sobre Pimentel. Um cita
saque em dinheiro vivo feito pelo agora governador dois meses após a
eleição de 2014. Outros dois tratam de operações com empresas das quais
Pimentel foi sócio. “As comunicações, além de envolverem saques em
espécie de alto valor, foram registradas porque Pimentel apresentou
resistência na apresentação de informações”, escreveu o Coaf em seu
documento.
Diz o Coaf sobre o governador petista de Minas:
“Fernando Damata Pimentel, com domicílio fiscal em Belo Horizonte, foi
objeto de comunicações efetuadas por empresas atuantes no mercado
segurador com valor associado total de R$ 676.588,00 e recebidas no
período de 2009 a 2014.”
“Parte dessas comunicações foi
reportada porque o titular apresentou resistência na apresentação de
informações, ou fornecimento de informações incorretas relativas à
identificação ou à operação”, acrescentou o Coaf.
Ainda de
acordo com o Coaf, Pimentel “foi objeto de comunicações automáticas por
ter efetuado duas operações de movimentação em espécie no montante de R$
300 mil, sendo uma de provisionamento para saque, em 18/12/2014, no
valor de R$ 150 mil, e outra de saque do mesmo valor em 19/12/2014. Tais
operações foram registradas na conta corrente número 4075218, da
agencia/CNPJ número 5645, do Banco do Brasil, na cidade de Belo
Horizonte.”
O Coaf acrescentou: “A primeira comunicação [sobre
Pimentel] reportou movimentação financeira da empresa Belorizonte Couros
Ltda. No montante de R$ 2.262.064, no período de 01/12/2009 a
31/05/2010, sendo R$ 979.020,00 a crédito e R$ 1.283.044,00 a débito,
registrado na conta corrente número 094368, da agência/CNPJ número 0557,
do Banco Itaú SA, na cidade de Regente Feijó/SP.”
Ouvidos, os
advogados de Pimentel afirmaram que o “governador apresentará todos os
esclarecimentos assim que as informações mencionadas forem
disponibilizadas nos autos do inquérito e que a defesa desconhece a
origem e o conteúdo dos documentos.”
No trecho dedicado a
Erenice Guerra, ex-braço direito de Dilma, o Coaf informa que ela
movimentou a impressionante cifra de R$ 26,3 milhões entre 2006 e 2015.
Parte dessa movimentação fluiu por meio de contas de terceiros.
O
Coaf escreveu: “Movimentação de recursos de alto valor, de forma
contumaz, em benefício de terceiro e também incompatível com a
capacidade financeira da cliente”.
“Erenice Alves Guerra, com
domicílio fiscal em Brasília, foi objeto de comunicações de operações
financeiras […] com valor associado de R$ 26.308.821, no período de 2008
a 2015, dos quais R$ 2.822.486,00 foi registrado em suas contas
correntes e o restante em contas de terceiros.”
O relatório
prossegue: “A empresa Guerra Advogados Associados, com sede em Brasília,
composta societariamente por Erenice Alves Guerra (98%) e Antonio
Eudacy Alves Carvalho (2%), foi objeto de comunicação de operações
financeiras […] por ter movimentado o montante de R$ 23.323.398,00 no
período de 08/08/2011 a 10/04/2015, sendo R$ 12.056.507,00 a crédito e
R$ 11.266.891,00 a débito, registrado na conta corrente número 104000,
da agência/CNPJ número 5746 – Península Sul, Brasília, do Banco Bradesco
SA, na cidade de Brasília.”
O coaf acrescentou: “A empresa
Capital Assessoria e Consultoria Empresarial Ltda., com sede no
Condomínio RK, em Sobradinho/DF, com status de ‘cancelada’ na Receita
Federal, composta societariamente por Saulo Dourado Guerra (60% – filho
de Erenice Alves Guerra) e Sônia Elizabeth de Oliveria Castro (40%), foi
objeto de comunicação de operações financeiras […] por ter movimentado a
crédito o montante de R$ 209.649,83, no período de dezembro de 2009 a
setembro de 2010, regitrado na conta corrente número 225.800-5, da
agencia/CNPJ número 3147 – Asa Sul, do Banco do Brasil SA, na cidade de
Brasília.” Procurada, Erenice não quis se pronunciar.